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Um Tal de Puerpério

  • Bárbara
  • 28 de jun. de 2018
  • 5 min de leitura

"Somos puérperas durante um período que dura, em minha opinião, muito mais do que os famosos quarenta dias. O puerpério não termina quando o obstetra dá alta após a cicatrização da cesariana ou da perineotomia (...) mas tem a ver, sim, com a emoção compartilhada e a percepção do mundo com olhos de bebê. Doloridas, cortadas, humilhadas em muitíssimos casos pelos maus tratos gerados durante o parto (embora poucas mulheres tenham consciência disso), expelindo líquidos por cima e por baixo e com um bebê que chora sem que possamos acalmá-lo, deparamos com uma angústia terrível, que piora depois das seis da tarde, coincidindo dramaticamente com o horário mais difícil para a criança... algumas mulheres sofrem também com a solidão, com a falta de amigos ou parentes que as compreendam e abracem, um marido (caso tenham um) que trabalha o dia inteiro e o vazio produzido pelo fato de não reconhecerem a si mesmas." 

- Laura Gutman em "A Maternidade e o Encontro com a Própria Sombra"

Para algumas, a descrição acima pode parecer um tanto dramática e exagerada. Para outras, um relato perfeito de como se sentiram durante o período que precede o parto. Isso tudo varia conforme as condições emocionais dessa mãe, o nível de sintonia entre ela e sua rede de apoio direta (seja um companheiro, uma mãe, uma amiga ou até uma doula), a quantidade de responsabilidades que essa mãe tem que gerenciar além do recém-nascido, como se dá o processo de amamentação e até mesmo a experiência do parto. Esse é um período tão sensível e delicado que se uma só peça nesse quebra-cabeça estiver fora do lugar, toda a experiência do puerpério pode ser afetada. As mães passam por um momento de luto durante o pós-parto, onde deixam de ser as mulheres que foram anteriormente para se tornarem provedoras de um pequeno ser indefeso, que exige atenção constante e pode não ser exatamente o que imaginávamos. Um ser que vem transformando a vida de todos ao seu redor. Mas principalmente a vida dessa mãe, que perde sua liberdade, e muitas vezes, até mesmo a sua identidade. 

Eu me considero uma mulher muito abençoada, que passou pelo período do puerpério com bastante tranquilidade. Meu marido é estudante de medicina e eu, educadora. Desde o início de nosso namoro já conversávamos sobre como a gente imaginava a criação de nossos filhos, desde a alimentação até técnicas de disciplina e educação. Quando nosso filho finalmente chegou, já formávamos uma equipe harmônica e bem preparada - pelo menos em teoria. Durante o puerpério, meu marido estava de férias da faculdade e a nossa família ajudava com as coisas básicas do dia-a-dia: eu tinha refeições servidas para mim todos os dias, casa limpa e roupa lavada. Só me restava focar no meu bem-estar e nos cuidados com o meu bebê. E MESMO ASSIM eu ainda senti momentos de insegurança, solidão e cansaço. De madrugada, enquanto amamentava meu filho, pensava nas mães solteiras e sentia o maior respeito por elas. Entendia o sofrimento de tantas mulheres que criaram seus filhos pelo mundo sem um terço do conforto que eu tinha disponível, e isso me dava forças para aproveitar o momento e sentir muita gratidão pelo presente que estava ali em meus braços, "calejando" meus mamilos.

Para aquelas mulheres que não possuem uma rede de apoio tão privilegiada quanto eu, podem pensar com antecedência e procurar estocar o freezer com alimentos saudáveis e saborosos. Se possível, considere adicionar uma diarista que possa arrumar a casa pelo menos uma vez por semana para ajudar a manter um mínimo de tranquilidade para que e mãe e bebê possam focar no que realmente é importante nesse momento. É importante que amigos e familiares estejam conscientes do quão delicado é esse processo para que possam ser sensíveis e manter um olhar vigilante em torno do estado emocional dessa mãe durante o pós-parto. O "baby blues," ou a depressão pós-parto, é bastante comum e pode ser gerenciado desde cedo, para que não se torne algo mais grave e atrapalhe o processo de maternagem e criação de vínculo mãe-bebê. Devemos nos desvincular da idéia de que esse momento é puramente lindo e mágico, e saber que a tristeza e o cansaço que podem surgir nessa hora não significam que essa mãe ama menos seu bebê.

Um dos maiores desafios que me surgiu durante o puerpério foi a intromissão de todos ao meu redor - inclusive estranhos na rua - e o constante questionamento em relação a forma como eu e meu marido decidimos cuidar do nosso filho, em um momento onde nós, mulheres, nos sentimos naturalmente - e até hormonalmente - fragilizadas e expostas. Cheguei a questionar até mesmo aqueles princípios que já estavam aparentemente bem-resolvidos dentro de mim por conta da constante pressão externa. Mas no fim do dia, eu conversava com meu marido sobre tudo aquilo que já havíamos decidido, nós nos entendíamos e reafirmávamos nossas crenças. E a cada dia que se passa, nos tornamos mais fortes e firmes em nossas decisões. De acordo com Laura Gutman, "Para atravessar o puerpério é preciso distinguir a necessidade pessoal de mergulhar na fusão e o medo ou incompreensão dos outros, que aceleram os processos, pois o que eles percebem é muito diferente de tudo que se sabe. Mas este é um problema dos outros. Ter clareza a respeito do próprio desejo, confiar na intuição e impulsionar o voo em direção ao interior da alma feminina são atitudes que facilitam a travessia."

Para aqueles pais sortudos que tem a oportunidade de prever a vinda de um bebê ou de planejar uma gestação futura, sugiro que conversem sobre as coisas que realmente são importantes na criação de um filho. Idealmente, os pais deveriam estar em sintonia um com o outro sobre as decisões básicas da criação de seus filhos. No começo, as decisões são simples: vamos usar mamadeira ou chupeta? Queremos receber familiares ou visitas no primeiro mês? Como imaginamos a rotina desse bebê? Quais vão ser as responsabilidades da mãe? E do pai, da avó, da tia, da babá...? No futuro, as decisões serão mais complexas, e aí que a sintonia do casal (ou da rede de apoio por trás dessa criança, seja quem for) vai ser mais importante! Como educadora, vejo que a grande maioria dos problemas de disciplina é resultado de uma criação onde os cuidadores não concordam com a forma de lidar com os desafios e utilizam estratégias diferentes.

Sugiro que as mulheres foquem menos em fazer enxoval em Miami e Chá de Revelação, e passem mais tempo se preparando para o período do pós-parto, que dêem atenção ao seu estado psicológico e emocional da melhor forma possível durante a gestação, que se cuidem e compartilhem com sua rede de apoio os seus medos, anseios e dificuldades. Quanto mais bem cuidada estiver essa mulher, mais saudável será o desenvolvimento do seu bebê. Invista mais em conhecimento, em diálogo, em uma equipe humanizada que possa te dar um apoio legal - não só durante o parto, mas depois do parto! Leia sobre amamentação, sobre a pega correta, sobre a diferença entre apojadura e mastite. Chame seu companheiro - ou seja quem for que está embarcando nessa aventura com você - para te acompanhar em rodas de gestante. Existem inúmeras formas de exercer a maternagem e a paternagem de uma criança, mas nós temos que nos sentir confortáveis e confiantes com a forma que queremos criar nossos filhos e nos entregar de corpo e alma. Saiba que momentos difíceis virão, mas que também irão trazer muitas oportunidades de aprendizado e amadurecimento. Nós, mulheres, somos capazes de uma superação incrível como mães. E se fomos capazes de fazer isso de forma consciente, estaremos dando o maior presente que nossos filhos poderão receber. 

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